A Polícia Civil deflagou na manhã desta terça-feira (29.11), a ‘Operação Descarrilamento’, contra organização criminosa envolvida em furtos e receptação de combustíveis e grãos da empresa de logística RUMO. Tais produtos foram subtraídos de vagões de trens estacionados ao longo da via férrea que cortam os municípios de Alto Araguaia-MT e Alto Taquari-MT.
A operação, que conta com a alocação de 91 policiais civis e 25 viaturas, tem como objetivo o cumprimento de 32 ordens judiciais, entre mandados de prisão e busca e apreensão, sendo 8 prisões preventivas, 16 busca e apreensão e 8 intimações para implementação de medidas cautelares diversas da prisão.
Os mandados judiciais foram expedidos pela Sétima Vara Criminal de Cuiabá, com base nas investigações da Delegacia de Polícia Civil de Alto Araguaia – MT, atualmente coordenada pelo delegado Marcos Paulo Batista de Oliveira. As ordens estão sendo cumpridas em Alto Araguaia-MT, Santa Rita do AraguaiaGO e Rondonópolis-MT.
A operação tem como alvo uma organização criminosa, que atua desde 2017 na região, na prática de furto de combustíveis e grãos dos vagões de trens de propriedade da empresa de logística RUMO. Estima-se que foram subtraídos mais de um milhão de litros de combustível e aproximadamente cem toneladas de grãos, causando um prejuízo superior a 6 milhões de reais.
Os criminosos, com o auxílio de funcionários da empresa lesada, que possuem informações privilegiadas quanto a programação de chegada, parada e partida dos trens, além do tipo de carga e nível de combustível dos vagões, se dirigiam até os locais de estacionamentos e de cruzamentos de trens e praticavam o furto, geralmente no período noturno e de madrugada. Utilizavam dezenas de galões, bomba de sucção, além de veículos para o transporte. Os produtos eram subtraídos diretamente dos tanques de combustíveis das locomotivas ou ainda dos próprios vagões (carregados de milhares de litros de combustíveis diversos e toneladas de grãos).
Nas investigações, que ocorreram entre maio/2020 e janeiro/2021, por intermédio da ‘Operação Prospecção’, foram identificados diversos agentes, sob o comando de uma liderança, com tarefas muito bem definidas. Alguns eram encarregados de fazer contato com os funcionários da empresa RUMO, outros prestar apoio logístico, outros executar o furto e repassar/negociar com empresários receptadores. Tinham também aqueles que atuavam como ‘olheiros’, no intuito de comunicar aos criminosos da presença da polícia na região, momento em que a ação era abortada naquele dia. Praticamente todos os dias a organização criminosa atuava, utilizando-se como código ‘realizar uma pescaria’, que significava praticar os furtos ao longo da via férrea.
Sabe-se que os envolvidos obtiveram lucros consideráveis com os crimes, adquirindo veículos e bens de alto valor, incompatíveis com a renda dos suspeitos. Um dos empresários, investigado por receptação, é proprietário de uma empresa de fabricação de ração, motivo pelo qual encomendava grãos, geralmente farelo de milho/soja, para ser utilizado como matéria prima em sua empresa. Sabe-se também que alguns empresários da região adquiriam combustível dos criminosos, por um preço inferior ao mercado, para serem utilizados em seus maquinários e veículos.
Apesar da existência comprovada desta organização criminosa, há também registros de furtos isolados, praticados por outros criminosos, dado que esta prática se tornou fácil e lucrativa na região. Inúmeros boletins de ocorrência e flagrantes foram registrados nos últimos anos na região, o que demonstra a ousadia, banalização deste tipo de crime e a periculosidade dos envolvidos.
Todos os envolvidos possuem histórico criminal, alguns deles já condenados inclusive pela prática destes mesmos crimes. Também respondem pelos crimes de tráfico de drogas, roubo e associação criminosa.
Alto Araguaia, cidade localizada ao sul do estado, distante 420Km da capital Cuiabá, é um importante ponto logístico do Estado de Mato Grosso, com rotas de escoamento estratégicas para os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás. É sede de um complexo ferroviário de grande porte, onde a empresa RUMO realiza suas operações. Há circulação de centenas de carretas diariamente, além de composições ferroviárias com dezenas de vagões. A permanecer esse estado de coisas, novas empresas poderão adiar seus investimentos ou até mesmo deixar de operar, causando desemprego e caos social.
Apesar dos crimes praticados, em tese, não envolver violência, trata-se de organização criminosa estruturada a causar prejuízo relevante, portanto, se não coibida poderá se transmudar para um grupo violento, causar acidente de grande repercussão (explosão de vagão combustível, por exemplo), além de inviabilizar a atuação das empresas de logística na região, em especial a empresa vítima, que recentemente anunciou a construção de novas linhas férreas no Estado, ligando Rondonópolis a Cuiabá e Lucas do Rio Verde, com aporte de bilhões de reais.
O delegado responsável pela coordenação da operação, Dr. Marcos Paulo, demonstrou preocupação com este tipo de crime: “Poderá colocar em risco o modal logístico ferroviário no Estado e no país. Esses crimes estão se tornando recorrentes e perigosos, com incidência de delitos desde furto simples até a atuação de organização criminosa especializada, que é o caso. Há registros de explosão de vagões, acidentes, mortes e corrução envolvendo delitos praticados contra esse modal. Acho até, considerando os vultosos investimentos realizados nesta área, que o Estado deveria estudar a criação de uma polícia ferroviária, que inclusive já tem previsão na Constituição Federal, em seu artigo 144, inciso III”.
O nome da operação faz alusão ao incidente provocado quando trens saem dos trilhos e a circulação é paralisada, de modo a retratar para os criminosos, que a atuação na região deve ser interrompida, sob pena de inviabilizar a atuação das empresas de logística na cidade. As investigações prosseguem e novos alvos poderão e serão implicados.